Cotidiano

É preciso renovar o olhar

Novo dia.

Novas histórias.

Novos livros.

Novas músicas.

Novas amizades.

Estamos sempre em busca de novidades. Parece que naturalmente somos inquietos. E nessa inquietude, buscamos o NOVO, seja na decoração da casa, na distribuição dos livros na estante, no trajeto até o trabalho, no sapato novo. Seja em um lugar diferente pra sair, uma nova receita, e até mesmo novas oportunidades de trabalho.

A novidade é como ar fresco, você inspira e expira sem pressa, sem medo, somente sente.

E em todo começo de ano… novidade é a palavra que resume o que buscamos em cada início e término de ciclo. Embora o fantasma do futuro venha nos assombrar, seja por meio da incerteza do amanhã, do cansaço pelos desafios superados no ano que terminou, seja pelas aventuras desconhecidas do ano que já começou.

O importante é ter algo diferente para olhar, para buscar inspiração, apoio e quem sabe força. Aqui está o segredo…o olhar. Tudo parece velho se você enxerga com os olhos do passado, do ontem, com os olhos de quem não vê mais perspectiva diante da rotina que lhe é imposta, aliás, só vira rotina se você permitir.

Lembro com muita sabedoria dos olhos de uma senhora que eu sempre encontrava quando era criança, na rua de um dos bairros em que eu morei, em Teresina, capital do Piauí. Ela me olhava com tanta ternura toda vez que eu passava com a mochila pesada arrastada pelo carrinho de rodinhas ao lado do meu irmão voltando do colégio. Eu fui crescendo e ela continuava ali. Não tinha mais a mochila. Não tinha mais o colégio no bairro, mas tinha uma senhora que me cativou e toda vez que eu passava por ela parava para cumprimentá-la. Porque o olhar dela me dizia tanta coisa, transmitia tanta paz, sabedoria…tranquilidade.

Eu mudei de bairro, de casa, de rotina. Mas aquela senhora não me esqueceu e toda vez que alguém da minha família passava por ela por um longo tempo, até todos se mudarem, ela perguntava pela menina sorridente, de olhar sereno.

Agora me dou conta como a vida adulta nos rouba a serenidade da infância. O tempo do cumprimento, a tranquilidade do dia a dia. Acho que daquela menina restou o sorriso, mas ampliado pela inconstância da ideia de novidade, da realização, da conquista e da premiação. Acho que também da consolidação.

Acho que o nosso erro é querer sempre mais – a melhor casa, o carro do ano, o melhor trabalho, a roupa exclusiva – e atrelamos a ideia de felicidade à realização, à conquista dessas coisas materiais. Que falta de maturidade! Para o psiquiatra e escritor, Augusto Cury, no seu livro ‘Dez leis para ser feliz’, felicidade representa uma conquista que começa nas pequenas coisas.

“É sentir o cheiro da terra molhada, e rir das próprias tolices. É ser alegre, mesmo se vier a chorar. É viver intensamente, mesmo no leito de hospital. É nunca deixar de sonhar, mesmo se tiver pesadelos. É ser jovem, mesmo se os cabelos embranquecerem. É contar histórias para os filhos mesmo se o tempo for escasso. É amar os pais, mesmo se eles não o compreendem. É agradecer muito, mesmo se as coisas derem errado. É transformar os erros em lições de vida”, ensina o autor.

Parece fácil? Não, é bastante complexo, mas quem disse que a complexidade não faz parte da vida adulta?

Então, o que nos resta é renovar o nosso olhar, a cada novo dia, a cada falha cometida, a cada fim e começo de ciclo. A cada noite, antes de dormir. Renovar os olhos que enxergam o mundo, mesmo se tudo ao redor estiver parado e sem perspectivas, afinal, eu sou responsável por aquilo que cativo!

*Imagem de Gerd Altmann por Pixabay