O jeito franzino, a voz tranquila, sorriso discreto e uma fé que move montanhas. Essas características são marcantes quando se conhece dona Irene, moradora da comunidade Maxixe, zona rural de Itainópolis, no estado do Piauí.
Há 15 anos convivendo com a diabetes, dona Irene é um exemplo de superação e amor pela agricultura. Sempre preocupada com a alimentação, os remédios e o tempo de exposição ao sol, ela se desdobrava para cuidar da roça e da saúde.
Embora com todos os cuidados necessários, surgiram calos em um de seus pés. As lesões progrediram e, mesmo com o tratamento clínico adequado, foi preciso amputar o pé em 2008. Ela abriu seu coração e me revelou que esse momento foi o mais difícil de sua vida. Os pés eram os membros do corpo que lhe davam liberdade, porque lhe possibilitava andar por todos os lugares. Foi necessário superar todos os obstáculos e apegos, e iniciar uma fase de adaptação.
O segredo para a superação foi a criação de galinha caipira, que ela tanto gostava. Uma atividade exigente que requer muita dedicação. Ainda lembro do brilho nos olhos daquela senhora explicando todo o processo. Foi uma tarde maravilhosa ao seu lado. A história de vida e de produção de Dona Irene, no semiárido piauiense, foi selecionada para um dos boletins de experiências de uma ONG (Organização não governamental), onde eu trabalhei.
E toda vez que eu encontrava o “meu personagem” me dava a oportunidade de experimentar a rotina dele. Passei a tarde naquela comunidade. Comi milho cozido, colhi cajá direto do pé, acompanhei passo a passo a rotina de uma dona de casa especial. Um ritmo mais lento e mais delicado. Por trás daquelas muletas e da necessidade especial, existia uma mulher forte e encantadora.
Dona Irene não tinha filhos. E o marido passou a ser o seu companheiro de vida. Ela me revelou que encontrou no amor por ele e o trabalho na zona rural, os motivos para continuar viva e ser feliz.
Ainda me recordo da intensidade daquele olhar. O olhar de uma agricultora familiar que descobriu na atividade de criação de galinhas motivos para seguir em frente. Nunca mais eu soube notícias sobre dona Irene. Deixei a ONG e fui trabalhar em outros lugares. Porém, o exemplo daquela mulher ainda me inspira e me faz ter a certeza de que nenhuma dificuldade é tão grande que a gente não consiga superar. É preciso seguir em frente, sempre!
* Imagem de Larisa Koshkina por Pixabay